A Pombinha
(De Anacreonte)

De onde vieste,
amável pombinha,
Gentil avezinha,
Aonde é que vás?
De onde trouxeste
Aroma tão brando
Que esparzes, voando,
Por todo esse ar?
– Foi Anacreonte
Que ao seu bem amado
Com meigo recado,
Aqui me mandou:
Seu bem, que reparte
Dos lumes divinos
Ao mundo os destinos
Num lânguido olhar.
Da maga Citera
O cego menino,
A troco de um hino
Ao vate me deu:
Sou de Anacreonte
Agora o paquete,
É dele o bilhete
Que vou entregar.
Prometeu-me cedo
De dar-me alforria,
Que eu antes queria
Sempre escrava ser...
Que gosto é no mato
Andar pelas fragas,
Viver só de bagas,
Nos ramos dormir?
Da mão de meu dono
Como alvo pãozinho
E só bebo vinho
Do que ele me dá.
Às vezes alegre
Saltando, esvoaço,
E sombra lhe faço
Com as asas a dar;
Ou quando me sinto
De sono pesada,
Na lira doirada
Me deito a dormir.
Adeus! que me fazes
Ser mais palradeira
Que a gralha grasneira
Com o teu perguntar.