O juiz árbitro, o hospitaleiro e o solitário
Três santos, cobiçosos igualmente
Da sua salvação,
Tomou cada um caminho diferente:
Todos a Roma vão.
Of’receu-se um – juiz de fama imensa –
A empenhar suas artes
Em congraçar as partes
E em julgar sem a mira em recompensa.
Escolheu hospitais o outro santo:
Louvo-o, que, na verdade,
A pura caridade
Filha é do céu que vence as mais no encanto.
Caprichou em tratar bem os doentes; Mas estes a rosnar
E, por fim, a ralhar,
Mostraram-se deveras descontentes.
«Oh! vai mal!...» Porque torna e porque deixa...
Uns são filhos amados,
Outros são enteados!...
E o homem desesp’rou com tanta queixa.
Pior foi ao juiz: jamais agrada
A sentença arbitral.
Sempre julgava mal!
E ele embirrou, por fim, com tanta chiada!
Vai ter c’o seu hospitaleiro amigo:
Iguais nas queixas são;
E resolvem-se então
A ir procurar nas selvas doce abrigo.
Encontram o terceiro, o solitário,
E lhe pedem conselho.
Diz-lhes o sábio velho:
«Aconselhar-se a si é o necessário.
Quem melhor do que vós sabe nas mágoas
O que mais lhe convém?
Pensai, meditai bem,
Mas na mansão da paz. Turvando as águas,
Não vereis reflectida a vossa imagem;
Sossegado regato,
Vereis vosso retrato
Podendo apreciá-lo com vantagem.»
Seguiram-lhe o conselho. – Não digo eu
Faz mal quem busca emprego;
Mas digo que o sossego
Obriga a meditar, e é um dom do Céu!
E não digo é mau no mundo
Haver de saber profundo
Esculápios e letrados...
Mas digo que tais fregueses
Costumam errar às vezes,
Por mal de nossos pecados!
J. I. de Araújo